Por Ana Campos
A política, quando utilizada para o fim correto, tem o poder de nos despertar para além de nós mesmos, nos trazendo o senso de comunidade, que invariavelmente se perde ao longo do nosso caminho, enquanto nos voltamos à individualidade da luta cotidiana por nossa própria sobrevivência.
Nos últimos tempos tenho procurado me envolver mais ativamente com o que acontece em minha comunidade, no bairro onde vivo há tantos anos e do qual, confesso, sempre fui um tanto alheia. Essa nova percepção sobre a necessidade de participar, tem me trazido a alegria de descobrir que, perto de mim, há pessoas que dão o exemplo sobre como todos nós deveríamos ser, para que o tão sonhado “mundo melhor”, algum dia possa se tornar realidade.
Na semana passada, ao visitar a sede da Associação de Moradores do Jardim da Ordem (AMUJOT), vila mais antiga dentre as que compõem o bairro do Tatuquara, para conhecer melhor o trabalho que eles desenvolvem junto à população local, descobri bem mais do que uma mera iniciativa dos líderes comunitários daquela região, descobri que a inspiração para a solidariedade praticada ali, vem de uma mulher, uma guerreira que muito antes da organização dessa liderança política local, construiu uma história de vida dedicada à servir ao próximo. Dona Iara é uma dessas pessoas que merecem nossa atenção e respeito, por tudo o que já fez ao longo do seu caminho para tornar a vida das outras pessoas um pouco melhor, um pouco menos árida.
Fui até lá para conversar com meu amigo, Claudio Blanco, filho de Dona Iara e um dos responsáveis pela Associação e pelo trabalho desenvolvido ali. A AMUJOT distribui semanalmente, frutas e verduras que vêm da CEASA e também roupas e calçados, cestas básicas e até móveis, para uma quantidade significativa de moradores locais, cadastrados por eles, de forma totalmente organizada. É um trabalho notável e muito importante de apoio às famílias carentes da região, que só é possível graças aos voluntários que ajudam na organização e distribuição das doações, toda semana. Preto Moraes (presidente da Associação), Franciele, Leda, Daniel, Angelina, Célia e Claudio, são os anjos da guarda, que tão devotadamente levam essa iniciativa adiante, já há pelo menos um ano.
Durante a visita, enquanto Claudio e os outros faziam a distribuição de alimentos para os representantes das famílias que se enfileiravam na rua, tive o prazer de ouvir dona Iara. Ela me contou um pouco sobre sua história, desde que chegou ao bairro. Conheci também, dona Terezinha, uma senhora muito idosa e já acamada, a qual dona Iara cuida há bastante tempo.
Terezinha foi encontrada por dona Iara e seu filho, Claudio, sozinha, abandonada em uma casa, já beira da morte. Eles a levaram pra casa, a alimentaram, a levaram ao médico e conseguiram na justiça o direito de ficar com ela. Desde então, dona Iara e seu filho se tornaram a família de Terezinha e, diariamente, cuidam dela, suprindo suas necessidades, não apenas de alimentação e remédios, mas também de atenção e carinho.
Esse é apenas um exemplo das iniciativas altruístas de Dona Iara, ela que também já teve em sua casa, uma creche e cuidava de cerca de 40 crianças todos os dias, para quem cozinhava, dava banho, divertia e levava para a escola, enquanto os pais podiam trabalhar tranquilos, sabendo que os filhos estavam em boas mãos. Dona Iara contou-me, sorridente, das vezes em que ia buscar cadeiras de rodas, doadas por programas de rádio, no centro da cidade e que voltava com elas nos ônibus lotados, para entregar a algum vizinho que estivesse precisando.
“Nunca me importei com dinheiro, com nada, eu me sinto bem em ajudar as pessoas e Deus sempre me recompensou, não deixando faltar nada pra minha família”.
Disse-me ela, com uma voz tranquila e serena.
Quando surgiu a ideia da Associação de Moradores, incentivada pelo ex-vereador do bairro, Rogério Campos, havia o empecilho da falta de um espaço físico para a sede da Associação e na reunião entre os membros que participariam da iniciativa, dona Iara, generosamente, cedeu sua casa para que servisse como sede. Claudio Blanco, seu filho, passou a morar com a mãe, na casa da frente e deixou a casa dos fundos, onde ele morava, para que se tornasse um depósito, onde agora eles guardam as doações recebidas, até o dia das entregas para a população local.
“Eu disse: pois eu cedo a minha casa, podem ocupar esse espaço. Isso vai me fazer bem, estar em contato com as pessoas, ajudar...”
- Contou-me ela.
Foi assim que começou o trabalho da Associação, sem nenhum tipo de ajuda da Prefeitura, fruto apenas da boa vontade das pessoas em fazer algo pela população carente do bairro. Hoje eles não contam com a ajuda nem mesmo dos comerciantes locais e ainda assim esperam poder expandir o projeto. Havia a expectativa de que conseguissem um espaço físico mais adequado, já que, com o tempo, a demanda das famílias carentes só vem aumentando, agravada ainda mais pela pandemia, porém a expectativa foi frustrada, devido a não eleição do vereador do bairro. Contudo, eles seguem firmes, fazendo o melhor que podem com que têm.
Saí daquela visita com o coração cheio de esperança, pois não é todos os dias que vemos exemplos de dedicação ao próximo, especialmente nesses tempos de tanto egoísmo, de tanta ganância e falta de amor, encontrar a fraternidade acontecendo tão perto da gente, é algo que nos enche de alegria.
Minha forma de colaborar com o trabalho deles é fazendo o que acredito que faço de melhor, que é escrever e dar a conhecer ao resto da cidade o que eles estão promovendo ali, algo que deve ser reconhecido e valorizado, assim como todas as outras iniciativas que acontecem pela cidade e por todo o país. Em tempos de ódio, toda forma de amor é um oásis, em meio ao deserto da indiferença.
Deixo aqui registrada a minha sincera admiração e respeito por Dona Iara, e por todas as Iaras do Brasil, que assim como ela, nos inspiram a promover o bem, não como uma moeda de troca, mas como um estilo de vida, onde a paz e a fraternidade são os objetivos para a nossa autorrealização.
Quem quiser ajudar o trabalho da AMUJOT com doações como roupas, calçados, alimentos, móveis e dinheiro, pode entrar em contato através do número abaixo.
Whatsapp: 41 9161-4168
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