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Foto do escritorCuritiba Suburbana

É TECNICAMENTE CORRETO CONSIDERAR BOLSONARO COMO FASCISTA?

Por Hemerson Ferreira



O termo "fascista" tornou-se uma espécie de palavrão ou xingamento. Ninguém gosta de ser considerado como tal, mesmo que apresente ou defenda suas características. Há também quem chame de fascista todos os seus desafetos, abusando do termo. Será que podemos considerar o bolsonarismo uma variante do fascismo? Vejamos...

Ao contrário de um jargão recorrente no senso comum, a história não "se repete" nunca. Os acontecimentos históricos não são como os fenômenos da física ou da matemática. Mesmo histórias muito parecidas possuem características próprias que acabam lhe dando certa originalidade. Portanto, rigorosamente falando, o bolsonarismo difere do fascismo em alguns pontos, ainda que o lembre em vários outros.

São características marcantes do fascismo italiano na primeira metade do século 20: movimento político autoritário, violento, militarista, nacionalista chauvinista, de extrema direita, conservador, homofóbico, golpista e chegado a teorias da conspiração absurdas. O fascista não acreditava na democracia, achando-a um regime fraco e permissivo demais. É praticamente um sinônimo de ditadura, às vezes escancarada, em outros momentos defendida de forma dissimulada. Privilegiava a força física bruta em vez da reflexão intelectual. Quer ganhar no grito e não no diálogo. Aliás, uma das principais características do fascismo é seu desejo de eliminar fisicamente toda oposição de qualquer natureza. Quem não concorda integralmente com o fascista era considerado um inimigo cujo destino deveria ser a morte. Anti-comunista feroz e raivoso, todo mundo que alguma forma discordasse do fascista era taxado como comunista.

Ao contrário do que alguns dizem, o fascismo não era um feroz inimigo do liberalismo econômico. Por ser autoritário, obviamente a ditadura fascista não era afeita ao voto universal, ao parlamento, ao judiciário, enfim, aos três poderes de Montesquieu. Contudo, basta lermos os poucos artigos da famosa Carta Del Lavoro para vermos claramente que eles defendiam a propriedade privada, o livre comércio e a iniciativa privada empresarial. O fascista buscava justificar seu estatismo como uma necessidade transitória devido ao "perigo comunista". No texto da Carta pode-se encontrar punições aos trabalhadores por diversos motivos, mas jamais os patrões. Em diversos governos de características fascistas, os responsáveis pela economia foram liberais, como nas ditaduras militares dos anos 1960-80 no Brasil, Argentina, Uruguai e sobretudo no Chile de Pinochet. Muitas vezes atrás dos ditadores de bota cerraram fileira os liberais de cartola...

Sociologicamente, o fascismo foi defendido pelos grandes empresários e pela cúpula da Igreja. O fascista foi um cão de guarda, um leão de chácara, um capanga violento que a burguesia precisou recorrer quando se viu ameaçada. Quem cria corvos pode levar bicadas: muitos iniciais apoiadores do fascismo sofreram depois de verem-no chegar ao poder e adquir força. Contudo, as classes dominantes apoiaram e se beneficiaram dos fascistas ao longo da história.

E o que o bolsonarismo tem a ver com isso?

Não é nenhuma novidade o caráter autoritário de Bolsonaro. Basta uma rápida busca no YouTube para encontrarmos diversas manifestações dele apoiando a ditadura militar de 64 e atacando a democracia, no passado, ou participando de manifestações recentes contra o STF ou que pedem a volta da ditadura. Seu governo é o mais repleto de militares desde a redemocratização. Há vídeos dele elogiando Hitler e posando com um cospley do Füher alemão na assembleia do Rio de Janeiro. Nem todo o bolsonarista é nazifascista, mas todo grupelho de direita extremista de ódio, como os Carecas do Brasil, amantes de armas de fogo ou Integralistas, já manifestaram seu apoio a Bolsonaro. É reconhecido por todos a ojeriza do bolsonarismo à imprensa, aos Direitos Humanos, OAB, sindicatos, movimentos sociais, professores e estudantes universitários etc. Durante sua campanha eleitoral no Acre, Bolsonaro chegou a dizer que metralharia os "petistas" (e como mostramos acima, todo e qualquer crítico do bolsonarismo, seja uma matéria num jornal, uma crítica qualquer de um político de qualquer partido ou sem partido, automaticamente será considerado petista/comunista). E não há nada mais fascista que isto...

O bolsonarismo é populista porque, ao contrário do fascismo italiano, conseguiu angariar votos e por não ter tanta força como os fascistas, precisa respeitar dissimuladamente as instituições democráticas, ainda que um e outro ministro ou filhos do presidente façam ameaças à democracia. É um populismo de direita. Diferente dos italianos que se apoiavam na Igreja Católica, o bolsonarismo tem como fonte de difusão a maioria das igrejinhas ou igrejonas evangélicas espalhadas por todo país. Outra vez, nem todo "crente" é bolsonarista, mas todo pastor homofóbico, reacionário e picareta usa o púlpito para falar bem do "mito" em suas pregações aos fiéis.

O nacionalismo bolsonarista, ao contrário dos fascistas old school, é uma farsa. O típico bolsominion odeia a cultura nacional, crítica o "brasileiro" em suas piadas nos churrascos como se não pertencesse a este povo, venera os EUA e sonha mudar-se um dia para Miami (assim que puderem). O "nacionalismo" deles limita-se a torcer pela CBF e cantar um hino que decoraram sem entender diversas palavras.

Enfim, o bolsonarismo tem uma história própria. Não é fascista porque ainda não instalou uma ditadura, porque fica histórica e geográficamente longe da Itália de Mussolini e porque tem sua digital pessoal. Tal qual Franco na Espanha, Hitler na Alemanha, Salazar em Portugal ou Pinochet no Chile, são parecidíssimos com fascistas, mas tiveram e tem suas faces especificas O bolsonarismo não é fascismo, mas sim um filho bastardo e desgarrado dele.


Hemerson Ferreira é mestre em História.


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