Por José Luís Fevereiro
Estas eleições de 2020 continuam sendo disputadas. Agora em pleno 3º turno confrontam-se as narrativas. Para a Rede Globo a esquerda perdeu às eleições. Aliás, já tinha perdido em 15 de novembro, porque perdeu a prefeitura de Piraporinha do Brejo e não reelegeu 2 vereadores em Nossa Sra do Rio Abaixo. A decorrência desta narrativa na versão Globo é que estamos para 2022 entre a direita (apelidada de centro) e o Bolsonarismo.
Esta narrativa encontra eco em parte da esquerda, que sustenta que agora ficou claro que sem uma aliança com o centro a esquerda não vence. Na ânsia de disputar os despojos da batalha, setores do campo progressista vêm se dedicando a fazer as exéquias fúnebres dos outros setores conquanto seguem proclamando a boa saúde e a perspectiva de longevidade de suas próprias hostes. Vamos aos números, esses seres antipáticos e desagradáveis para o vicejamento das teses de conveniência:
Divido o campo progressista em esquerda composta pelo PT, PSOL e PcdoB ( não inclui partidos sem representação parlamentar) e centro esquerda, PSB,PDT e Rede. Do ponto de vista da disputa ideológica me concentro nas grandes e medias cidades onde a eleição é menos fulanizada. Em 2016 a esquerda disputou 12 eleições no segundo turno e perdeu as 12. Agora disputou 18 e venceu 5, mas mesmo onde perdeu, o salto de qualidade é visível. Começando por S.Paulo, onde, em 2016, Doria venceu no 1º turno. Ter um líder de movimento sem teto no segundo turno com 41% dos votos e vencendo na periferia, não é resultado de pouca monta. Vencendo, segundo todas as pesquisas, no eleitorado mais jovem.
Manoela D’Avila teve 46% dos votos em Porto Alegre, onde a última vitória da esquerda foi em 2000. Parte do eleitorado nem nascido era. Disputar o segundo turno em Caxias do Sul, na serra gaúcha, bastião do conservadorismo, também não foi resultado de pouca monta. Retomar Diadema e ter candidatura competitiva em Guarulhos, também é resultado positivo, mesmo perdendo. Vencer na principal capital do norte com Edmilson, em Belém, também mostra que as coisas se movem. Em Minas, vencer em Juiz de Fora e em Contagem, onde Bolsonaro venceu em 2018, também é muito relevante. Balanço eleitoral não pode ser feito com as expectativas da véspera das eleições, no calor da campanha, mas com os resultados de eleições anteriores.
Resultados eleitorais não são, essencialmente, frutos de campanhas bem conduzidas, mas o resultado de uma disputa política e ideológica na base da sociedade. A derrota, ou melhor dizendo, a capitulação em travar essa disputa em nome da “governabilidade “ durante os 13 anos de governos do PT, construiram as bases para a reação conservadora a partir de 2016. O que se vê agora, a partir desta eleição, é que a retomada da disputa de valores na base da sociedade, em particular nos grandes centros e nas regiões sul e sudeste começa a apresenta resultados. Já no 1º turno, mulheres, negros, ativistas LGBT conseguiram resultados eleitorais expressivos, mesmo em lugares mais conservadores. Candidaturas coletivas, em boa parte com origem em movimentos socias da periferia, também mostram isso.
Se levarmos em conta que Bolsonaro venceu com folga em todos os grandes centros da região sul e sudeste, o resultado desta eleição está longe de ser uma derrota. Do ponto de vista da esquerda, esta eleição mostra uma recuperação, ainda que insuficiente para produzir vitórias eleitorais mais expressivas. Agrego outro número importante: PT e PSOL que somados fizeram em 2016, 35 vereadores nas capitais do Sul e Sudeste, fizeram agora, 45. O PSOL cresce relativamente de forma muito significativa, passando de 16 para 23 vereadores e o PT passa de 19 para 22. O PSOL passa nesta eleição a disputar protagonismo na esquerda com o PT. Mostra que tem mais expressão entre a juventude e nos novos movimentos sociais ascendentes.
O PT enfrenta problemas de renovação. Mesmo recuperando peso, mostra envelhecimento e dependência de quadros mais experientes e dificuldades de conexão com o eleitorado jovem. No entanto é, na esquerda, o partido que ainda tem mais capilaridade nacional e que segue imprescindível.
O fracasso do PDT no Rio e do PSB em S.Paulo com candidaturas em tons cinza que buscaram dialogar com o conservadorismo e apostar na despolarização, mostra que, sem formar uma base sólida e militante, não se viabilizam alternativas. Fracassaram na majoritária e elegeram bancadas pífias de vereadores.
Bolsonaro é o grande derrotado como se esperava, mas o Bolsonarismo está vivo em parcelas expressivas da sociedade e sempre será a reserva estratégica da burguesia. As derrotas em S.Gonçalo e Vitória e as vitórias mais apertadas que o previsto em Belém e Fortaleza, deixam isso claro.
A narrativa da direita (centro na terminologia do manual de redação da Globo), a partir desta eleição, é que só ela pode vencer Bolsonaro. Para isso precisa organizar o funeral da esquerda, no geral e do PT no particular. Conta com as carpideiras da Cirolândia para legitimar a narrativa.
É tarefa dos partidos da esquerda, levantar a cabeça, contabilizar os avanços e as insuficiências e retomar a disputa de valores na base da sociedade. O combate aos oportunistas da Fé, a defesa da solidariedade contra o individualismo, dos direitos sociais e civís, sem concessões nem meias tintas.
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