Neste 10 de dezembro, celebram-se os 100 anos de Clarice Lispector.
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Nascida judia em uma Ucrânia soviética, a escritora veio para o Brasil com a família e passou a infância entre Alagoas, Pernambuco e Bahia. Em 1935, aos 15 anos, a adolescente Clarice chegava ao Rio de Janeiro, cidade onde construiria sua vida acadêmica, profissional e familiar. Mais tarde, como esposa de diplomata, viriam outros destinos, mas nenhum tão marcante quanto a capital carioca, cenário de muitos dos seus escritos.
No Brasil, os membros da família aportuguesaram seus nomes. O pai Pinkhas ou Pinkhouss passou a ser Pedro, e a mãe Marian ou Mania transformou-se em Marieta. Das filhas, Leah virou Elisa; Tcharna, Tânia; e Chaya, Clarice.
Casada com um diplomata brasileiro, a escritora morou fora do país de 1944 a 1959 (Itália, Suíça, Inglaterra e Estados Unidos), quando se separou e retornou ao Brasil, onde viveu até sua morte, em 9 de dezembro de 1977, um dia antes do seu aniversário de 57 anos.
Das crônicas aos textos mais experimentalistas, como "Uma Aprendizagem" ou "O Livro dos Prazeres" (1969) e "A hora da estrela" (1977), há detalhes sensíveis de bairros do Rio em que Clarice Lispector morou, estudou ou trabalhou, além do Jardim Botânico e da Floresta da Tijuca, que amava e frequentava a lazer.
Comparada à Virgínia Woolf e James Joyce, considerada hermética, permeada por experimentação linguística, entrelinhas e "silêncios", com enredo praticamente inexistente e quebra das regras de pontuação — romance iniciando com vírgula e terminando com dois pontos, por exemplo — a obra de Clarice Lispector (1920-1977) não é de fácil leitura.
Em seu livro "Para amar Clarice - Como descobrir a apreciar os aspectos inovadores de sua obra", a escritora e professora de literatura, Emilia Amaral escreveu que Clarice Lispector "viveu e escreveu sob os signos da fascinação e paradoxo: adorada por muitos, eleita como objeto de várias tendências críticas, ao mesmo tempo, avessa a diferenciações de gênero, entre outras categorias classificatórias. Bastante citada, adulterada, popularizada por um viés pseudofilosofante, a escritora é simultaneamente considerada hermética".
Curiosidades
· Clarice se apaixonou por quem viria a ser seu grande amigo confidente, o escritor Lúcio Cardoso (1912-1968), contudo, não ficaram juntos porque Lúcio era homossexual.
· Um episódio marcante de sua vida foi o incêndio que ocorreu em sua casa em 1966, provocado por um cigarro. Como consequência, ficou hospitalizada durantes meses e quase teve de amputar sua mão.
ALGUNS POEMAS DA AUTORA:
Precisão
O que me tranquiliza é que tudo o que existe, existe com uma precisão absoluta. O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete não transborda nem uma fração de milímetro além do tamanho de uma cabeça de alfinete. Tudo o que existe é de uma grande exatidão. Pena é que a maior parte do que existe com essa exatidão nos é tecnicamente invisível. O bom é que a verdade chega a nós como um sentido secreto das coisas. Nós terminamos adivinhando, confusos, a perfeição.
A lucidez perigosa
Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.
Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
- já me aconteceu antes.
Pois sei que
- em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade -
essa clareza de realidade
é um risco.
Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve
para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.
Frases de Clarice Lispector
· “Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome.”
· “Minhas desequilibradas palavras são o luxo do meu silêncio.”
· “Ainda bem que sempre existe outro dia. E outros sonhos. E outros risos. E outras pessoas. E outras coisas.”
· “Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.”
· “Mas quero ter a liberdade de dizer coisas sem nexo como profunda forma de te atingir. Só o errado me atrai, e amo o pecado, a flor do pecado.”
· “O medo sempre me guiou para o que eu quero. E porque eu quero, temo. Muitas vezes foi o medo que me tomou pela mão e me levou. O medo me leva ao perigo. E tudo o que eu amo é arriscado.”
· “Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento.”
· “Sim, minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite.”
FONTES:
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