Por Ana Marinho
Emiliano Perneta, Tasso da Silveira, Laura Santos, Helena Kolody, Paulo Leminski, Alice Ruiz, Geraldo Magela, Isabel Furini, Antonio Thadeu Wojciechowski e Alvaro Posselt.
Curitiba completa 328 anos e é hora de comemorarmos homenageamos aqueles que ajudaram a construir também uma Curitiba literária, mais especificamente, uma Curitiba poética. Eu selecionei dez, dos que considero serem os maiores nomes da poesia curitibana, tanto do passado, quanto do presente e que inspiram gerações inteiras a continuarem fazendo desta cidade, um berço da boa poesia. Eu poderia incluir muitos outros, caso o espaço me permitisse, mas acredito que esses nomes já representam a multiplicidade criativa e os diferentes estilos que vertem do espírito poético curitibano e que todos os outros, que não puderam ser citados aqui, sentir-se-ão devidamente representados nesta singela homenagem.
Segue pequeno resumo e amostra dos poetas e poetisas, que aqui representam a poesia da nossa cidade.
EMILIANO PERNETA:
Considerado o Príncipe dos poetas do Paraná. David Emiliano Perneta nasceu e morreu em Curitiba. Formou-se advogado pela Universidade de São Paulo. Além de ter sido jornalista, advogado e professor de português, Perneta foi um dos fundadores do clube republicano de Curitiba e publicou, em livros, jornais e revistas, poesia e prosa poética simbolista.
Sua obra poética inclui Ilusão (1911), Pena de Talião (1914) e os póstumos Setembro (1934) e Poesias Completas (1945).
ESSE PERFUME
Esse perfume — sândalo e verbenas —
De tua pele de maçã madura,
Sorvi-o quando, ó deusa das morenas!
Por mim roçaste a cabeleira escura.
Mas é perfídia negra das hienas!
Sabes que o teu perfume é uma loucura:
— E o concedes; que é um tóxico: e envenenas
Com uma tão rara e singular doçura!
Quando o aspirei — as minhas mãos nas tuas —
Bateu-me o coração como se fora
Fundir-se, lírio das espáduas nuas!
Foi-me um gozo cruel, áspero e curto...
Ó requintada, ó sábia pecadora,
Mestra no amor das sensações de um furto!
Publicado no livro Ilusão (1911).
TASSO DA SILVEIRA
(1895-1968)
Poeta e escritor curitibano (Paraná, Brasil). Formado em Direito, no Rio de Janeiro. Considerado um dos representantes da ala espiritualista do modernismo, ao lado de Cecília Meireles e Tristão de Ataíde. Pertenceu ao grupo da Revista Festa, da qual foi um dos fundadores. Estreou como poeta com Fio d'Água, em 1918. Somente a partir do terceiro livro — Alegorias do Homem Novo—, em 1926 é que adere ao verso livre.
EFEITO DE LUZ
Sob o silêncio que flutua,
no crepúsculo
a angra é um espelho de cristal.
De súbito, porém, rompendo a superfície polida,
como um brusco
reflexo,
o peixe prateado e liso
pula no ar
em esplêndido, caracoleia no crepúsculo
e retomba no seio da água adormecida,
que, sonhando, o supõe numa chispa de luar...
(As Imagens Acesas, 1928)
Fonte:
LAURA SANTOS
Pouco conhecida entre os leitores paranaenses, a poeta negra, Laura Santos escreveu uma obra enxuta, em que a temática erótica se sobrepõe a questões como negritude.
Conhecida por alguns poucos curitibanos, Laura Santos (1919- 1981) talvez tenha sido a única poetisa negra de Curitiba dos anos 1950. Dona de uma linguagem sensível, Laura, a “pérola negra”, como ficou conhecida, fez uma poesia com alta carga erótica, elucidando o corpo como objeto da sua própria linguagem.
Laura Santos (1919-198) nasceu em morreu em Curitiba. Fundadora da Academia José de Alencar, é autora de Sangue tropical, Poemas da noite e Desejo, todos de 1953.
PRIMEIRO POEMA
Quando, envolta em penumbra, a meditar me ponho, na doce exaltação deste exaltado sonho na esplêndida mudez desta noite sem lume, principio a sentir em tudo o teu perfume. Levemente ao redor do meu leito flutuas, sinto em meios seios nus as tuas faces nuas, e o teu vulto sutil, subjetivamente, em insano prazer, em volúpia fremente como serpe voraz, se enrola no meu ser. E quando eu volto, de repente, da fria realidade, compreendo que é a saudade que me fez te sentir, que me fez te gozar; e, nesta noite fria, eu encontro somente a triste solidão de minha alma vazia.
Fontes:
HELENA KOLODY
Filha de ucranianos, Helena Kolody, natural de Cruz Machado, no interior do Paraná, iníciou nas artes na cidade catarinense de Mafra. O local propiciou à poetisa a oportunidade de estudar pintura, piano, e de produzir, aos 12 anos de idade, seus primeiros versos. Em 1927 se instalou em Curitiba, onde veio o primeiro poema publicado, “A Lágrima”, aos 16 anos de idade. Aos 20 anos, Helena iniciou a carreira de professora do Ensino Médio e inspetora de escola pública. Lecionou no Instituto de Educação do Paraná por 23 anos. Seu primeiro livro, publicado em 1941, foi “Paisagem Interior”, dedicado a seu pai, Miguel Kolody, que faleceu dois meses antes da publicação.
SONHAR Sonhar é transportar-se em asas de ouro e aço Aos páramos azuis da luz e da harmonia; É ambicionar o céu; é dominar o espaço Num vôo poderoso e audaz da fantasia. Fugir ao mundo vil, tão vil que, sem cansaço, Engana, e menospreza, e zomba, e calunia; Encastelar-se, enfim, no deslumbrante Paço De um sonho puro e bom, de paz e de alegria. É ver no lago um mar, nas nuvens um castelo, Na luz de um pirilampo um sol pequeno e belo; É alçar constantemente o olhar ao céu profundo. Sonhar é ter um grande ideal na inglória lida: Tão grande que não cabe inteiro nesta vida, Tão puro que não vive em plagas deste mundo.
Fontes:
PAULO LEMINSKI
(1944-1989)
Foi um poeta, escritor, tradutor e professor brasileiro. Fez uma poesia sem compromisso, destacou-se com “Catatau”, obra “maldita” marcada por exacerbado experimentalismo linguístico e narrativo.
Paulo Leminski Filho nasceu em Curitiba, Paraná, no dia 24 de agosto de 1944. Era filho de Paulo Leminski, militar de origem polonesa, e Áurea Pereira Mendes, de descendência africana.
Em 1964, publicou seu primeiro poema na revista “Invenção”, editada pelos concretistas. Nesse mesmo ano, assume o cargo de professor de História e Redação em cursinhos pré-vestibulares.
Publicava seus textos em revistas alternativas, antológicas do tempo marginal, como “Muda”, “Código” e “Qorpo Estranho”, segundo ele mesmo, publicações que consagraram grande parte da produção dos anos 70.
BEM NO FUNDO
No fundo, no fundo, bem lá no fundo, a gente gostaria de ver nossos problemas resolvidos por decreto
a partir desta data, aquela mágoa sem remédio é considerada nula e sobre ela — silêncio perpétuo
extinto por lei todo o remorso, maldito seja quem olhar pra trás, lá pra trás não há nada, e nada mais
mas problemas não se resolvem, problemas têm família grande, e aos domingos saem todos a passear o problema, sua senhora e outros pequenos probleminhas.
Fontes:
ALICE RUIZ
Alice Ruiz (1946) é uma poetisa e compositora brasileira. Com mais de 20 livros publicados, tem seus poemas traduzidos para diversos países.
Alice Ruiz Scherone nasceu em Curitiba, Paraná, no dia 22 de janeiro de 1946. Seu interesse pela literatura começou muito cedo. Com apenas 9 anos passou a escrever contos.
Com 16 anos, Alice já se dedicava ao verso. Dez anos depois, publicou em revistas culturais e em jornais os seus primeiros poemas.
Em 1968, Alice Ruiz se casou com o poeta Paulo Leminski (1944-1989), com quem teve três filhos. Foi ele quem descobriu que Alice escrevia “haicais” (forma poética de origem japonesa), o que levou a autora pesquisar e estudar essa forma de fazer poesia.
AGORA
Agora sim tenho a morte na alma e a vida nas mãos haja ou não um você aqui agora estou só agora sim o que sobrar de mim é meu agora não há mais dúvida pagando todas as dívidas me livrarei deste eu este agora que me escapa me inaugura e funda outro eu que vai pro mundo outra dor que vai a furo outro agora ainda mais fundo por um segundo mais claro agora é claro que seja escuro
Fonte:
GERALDO MAGELA
É poeta, editor, performer, produtor cultural, ator e educador. Nasceu em 1956, em Minas Gerais, filho da professora e poetisa Maria Lisbela Cardoso e de José Gonçalves Cardoso, boiadeiro.
Entre os livros publicados destacamos: Bendita Boca Maldita, poemas, 1982; Os Calombos dos Quilombos, poesia afro; 1983.; Se Metamorfose, poemas concretos, 1984.; Coletânea da Revista Feira do Poeta, poemas, 1986; Poesygynyka, poesia em rolo de papel higiênico – 1986.; Os Mamilos de Vênus, poemas eróticos – 1986; O Homem é Produto do email, microcontos – 2015; O Rebu do Urubu e o Legado do Leão, infantil.
O VOO QUE DRIBLOU A MULTIDÃO EM ÍCARO PESADELO
Navegou em ascensão como uma estrela cintilante no manto negro da madrugada do absoluto céu latino
Toda a via aérea só corroeu a retina retilínea de cumulus nimbus voo. Como pássaro prateado cadenciou uma rota torta em ponto
divergente/trágico/nevrálgico meteoro incidente. No lusco-fusco espacial, vagalume perdeu o lume e esfacelou-se “kamiQUASE”. Como cruz comungou com Deus o pacto desportivo nas alturas. Turbulência intemperial...impacto. Com atletas e companheiros a bordo e em desalinho... ousou voo altaneiro sobre cimos MEDELLINhos e lançou-se numa curva abrupta. Como crespa vespa estatelou-se. Dos 81...soçobraram 6 vozes ao relento das vozes frias do vento.
Fontes:
ALVARO POSSELT
Nasceu em Curitiba, em 1971. É professor de língua portuguesa e poeta. Tem cinco livros publicados, entre eles Tão breve quanto o agora e Entre arranhões e lambidas — haicais & gatos. Alguns de seus haicais foram escolhidos pelo projeto “Giz e aprendiz” (que revitaliza a cidade) e podem ser conferidos nos muros de centro da capital paranaense. Posselt vive em Curitiba (PR).
Como ela rebola
Rainha do carnaval
a minha vitrola
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Um vulto no muro
Não fuja! Pia a coruja
e some no escuro
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Ah, Wilson Bueno!
Que embalo tem o cavalo
desse tio Roseno
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A chuva na calha
Escravo do sono eu travo
a mesma batalha
Fonte:
ANTONIO THADEU WOJCIECHOWSKI
Nasceu em Curitiba, Paraná, no dia 24 de dezembro de 1950. É professor e poeta. Professor de Comunicação e Expressão, Língua Portuguesa e Literatura Brasileira do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (1978/1983). Professor de Semiótica e Linguagem Avançada da Sociedade Paranaense de Ensino de Informática (SPEI, 1983-1985). Professor de todos os cursos de aperfeiçoamento em ensino de literatura aos professores de Literatura Portuguesa (Salvador, 1983). Professor da Unioeste - Universidade do Oeste do Paraná, para ministrar curso de atualização cultural aos professores, pró-reitores e diretores dos centros acadêmicos (2000 e 2001).
Obras: Um grito na cidade cinzenta, Sala 17, Reis Magros, Thadeu 1, Sangra Cio, Thadeu 2, Meteoro,O Corvo, Feiticeiro Inventor, Pérolas aos Poukos, Os Catalépticos, O Livro do Tao, Eu, Aliás, Nós, O Amor é Lino, Assim até eu.
VIDA
um ano a mais um ano a menos que diferença faz quando já somos mais ou menos mais suaves mais sábios mais fortes mais justos e de mais a mais cromossomos
um ano a mais um ano a menos a vida é cais e lá vão nossos sonhos: barcos pequenos
um ano a mais um ano a menos lendo os sinais nos esquecemos e quando nos lembramos é tarde demais
um ano amais outro odiais um ano demais outro de menos um ano tanto fez outro tanto faz um ano como nunca houve outro um ano sem pagar e só levando o troco
um ano que vem um ano que vai e os mesmos ais mais amenos
Fontes:
ISABEL FURINI
Isabel Florinda Furini, mora em Curitiba/PR, nasceu em Buenos Aires em 1949. É poetisa, escritora, educadora e palestrante. Morou em Medellín e em Bogotá (Colômbia), de 1975 à 1980. Fez várias viagens ao Peru, e em uma delas permaneceu 6 meses em Lima, estudando as culturas pré-incaicas. Em 1995 e 1998, esteve em Machu Picchu e em Cusco onde fez contato com o xamanismo e escreveu um livro no qual narra sua viagem. Publicou livros abordando o esoterismo, além da filosofia e psicologia orientais. Mas sua paixão sempre foi a poesia, sendo que desde criança escreve poemas. Seu primeiro livro “O Homem e Deus”, no idioma português, foi publicado na cidade paranaense de Curitiba, no ano de 1985.
FOTOGRAFIA DE UM GIRASSOL
Ontem olhei um girassol e senti que ele nos convida a repensar nossa vida analisar nossos atos reavaliar nossas feridas e entender que a alma desvalida só tem um Sol que a motiva "na escura noite da alma"... é preciso permanecer em calma e algemar nosso coração à Deus pois quando caem os véus do orgulho e da ambição só fica inalterável no céu e o infinito amor de Deus.
Fontes:
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